domingo, março 27

Artigo de opinião para análise na aula de L.P.

Ana Martins
Artigo publicado no semanário "Sol" de 15 de Agosto de 2008, na coluna "Ver como se diz".


A "Lusa" publicou uma reportagem (30/07/08) sobre a grafia estropiada nos SMS e chats.
Foram consultados professores do ensino básico e secundário, que se revelaram apreensivos quanto à possibilidade de a alteração arbitrária da grafia (a «nova linguagem dos jovens») pôr em risco a sobrevivência do português. Lamentam que os mais novos se estejam a esquecer da ortografia; que usem invariavelmente x em vez de ch, s, ss ou z; k em vez do c ou qu; que escrevam kk em vez de qualquer; kd em vez de quando; tamx em vez de estamos.
Foi ouvido o linguista Malaca Casteleiro, que fez saber que a grafia se faz por memorização intuitiva e que, assim sendo, o uso recorrente de formas gráficas deturpadas confunde os jovens na hora de escrever correctamente.
Ora, esta peça jornalística assenta em vários equívocos.
Primeiro: a ortografia não se identifica com a língua. A escrita sucedeu à fala e a linguística nasceu reivindicando a essência oral da língua. Mas se isto interessar pouco ao leitor, pense então que o inglês, o alemão ou o italiano não estão em colapso, apesar de os jovens falantes daquelas línguas usarem também um código gráfico libertino.
Segundo: o que se transmite é apenas uma opinião sobre práticas ortográficas. Não há, para o português, nenhum estudo quantitativo que permita concluir acerca dos efeitos deste desregramento gráfico no declínio do património linguístico, como, por exemplo, o estudo dos canadianos Sali Tagliamonte e Derek Denis, publicado na revista American Speech (Maio, 2008), com um corpus de cerca de um milhão de palavras usadas em mensagens instantâneas. Estes investigadores concluíram, aliás, que estas mensagens apresentam o mesmo grau de heterogeneidade característico das variedades linguísticas tradicionalmente reconhecidas (registos coloquiais, gírias, dialectos, etc.).
Por último: o fim dos tempos do português não está no facto de os jovens inventarem um tipo de escrita para comunicarem entre si por telemóvel, mas sim na condescendência queixosa dos professores e da escola face à presença deste tipo de escrita em fichas e provas de avaliação.


* in semanário "Sol" de 15 de Agosto de 2008 :: 16/08/2008

Resenha final da obra camoniana.

Não mais, Musa, não mais, que a Lira tenho
Destemperada e a voz enrouquecida,
E não do canto, mas de ver que venho
Cantar a gente surda e endurecida.
O favor com que mais se acende o engenho
Não no dá a pátria, não, que está metida
No gosto da cobiça e na rudeza
Duma austera, apagada e vil tristeza.

Para saber mais, clica em: http://www.tabacaria.com.pt/lusiadas/final.htm


Exercício: Imagina que és um crítico de cinema! Faz uma sinopse da obra camoniana. (Relembra os recursos de estilo usados pelo poeta, que propiciaram um impressionismo fabuloso aos episódios narrados.)

domingo, março 20

O fim da viagem...

Como terá sido, para os nautas, a sensação de chegar à Índia? Como terão sentido a sensação do fim?
Tens o Google Earth? Se a resposta for afirmativa, segue o link e delicia-te a "viajar"!
[...] Que diferença para os navegadores dos Descobrimentos! Esses saíam do Restelo e enquanto vissem a orla da praia estavam ligados ao mundo; mas, desaparecida ela, eram homens totalmente perdidos de quem ninguém mais sabia nem os outros deles nem eles dos outros. Cada um dos que ficavam ia à sua vida pelas ruelas da cidade moirejando o seu pão e eles, os navegadores, tanto podiam ir para o fundo das águas, como arribarem nas ilhas verdes e serem cortados às postas, como tornarem-se reis dos indígenas, que ninguém sabia de nada. Era o abandono total. Era a fome, a sede, o escorbuto, a agonia, a revolta, a traição, a morte lenta e raivosa, sem remissão possível, o bambolear enjoativo e incansável do madeiro sobre as águas. Passavam-se meses, um ano, dois anos. Às vezes sucedia voltarem e então vinham contar o que tinham passado. Tinham passado a maior aventura de todos os tempos, e, além disso, vinham sabendo que havia no mundo homens de outras cores, organizados segundo outras formas de sociedade, em que a moral era diferente, os valores humanos outros, os deuses outros, e que a Terra era redonda e que girava em torno do Sol como qualquer outro insignificante planeta. Sentavam-se na praia a pensar nisso e tinham nos olhos o brilho de um homem novo.
Rómulo de Carvalho, O Astronauta e o Homem dos Descobrimentos, in "O Comércio do Porto" (Plural, 2004: 234)
O recurso da nossa aula:

PP fim

Um pouco de História:
A armada 
   Nau                  Capitão                         Piloto                          Mestre                      Escrivão
São Gabriel         Vasco da Gama          Pêro de Alenquer           Gonçalo Álvares                 Diogo Dias
São Rafael           Paulo da Gama            João de Coimbra                     ---                        João de Sá
Bérrio                  Nicolau Coelho           Pêro Escobar                          ---                       Álvaro de Braga


Navio de
mantimentos        Gonçalo Nunes            Afonso Gonçalves

Entre os mareantes, incluiam-se dois intérpretes, Fernão Martins e Martim Afonso de Sousa, e dois frades, João Figueira e Pêro da Covilhã. Ao todo, as tripulações perfaziam 170 homens.
Os marinheiros dispunham de cartas de marear onde estava marcada toda a costa africana conhecida até então, de quadrantes, astrolábios de vários tamanhos, de regimentos e de tábuas com cálculos — como as tábuas astronómicas de Abraão Zacuto —, de agulhas e prumos. Um dos navios transportava exclusivamente mantimentos para três anos: biscoitos, feijão, carnes secas, vinho, farinha, azeite, salmouras e outras coisas de botica. Estava previsto o reabastecimento contínuo ao longo da costa de África. A viagem à Índia foi realizada por 3 naus e um navio de mantimentos.

Regresso a Portugal:


Vasco da Gama apresenta a D. Manuel as primícias da Índia (Biblioteca Nacional de Portugal, c.1900)A 12 de Julho de 1499, depois de mais de dois anos do início desta expedição, entra a caravela Bérrio no rio Tejo, comandada por Nicolau Coelho, com a notícia que iria emocionar Lisboa: os portugueses chegaram à Índia pelo mar. Vasco da Gama tinha ficado para trás, na ilha Terceira, preferindo acompanhar o seu irmão, gravemente doente, renunciado assim aos festejos e felicitações pela notícia.
Das naus envolvidas, apenas a São Rafael não regressou, pois teria sido queimada por incapacidade de a manobrar, consequência do reduzido número a que se via a tripulação no regresso, fruto das doenças responsáveis pela morte de cerca de metade da tripulação, como o escorbuto, que se fez sentir mais afincadamente durante a travessia do Oceano Índico. Apenas 55 dos 148 homens que integravam a armada sobreviveram a este grande feito.
(Fonte: Wikipedia)

segunda-feira, março 14

Sinopse

Wordle: Untitled

Despedidas em Belém















Estâncias 90 a 95 d'Os Lusíadas:

Qual vai dizendo: —" Ó filho, a quem eu tinha
Só para refrigério, e doce amparo
Desta cansada já velhice minha,
Que em choro acabará, penoso e amaro,
Por que me deixas, mísera e mesquinha?
Por que de mim te vás, ó filho caro,
A fazer o funéreo enterramento,
Onde sejas de peixes mantimento!"















Qual em cabelo: —"Ó doce e amado esposo,
Sem quem não quis Amor que viver possa,
Por que is aventurar ao mar iroso
Essa vida que é minha, e não é vossa?
Como por um caminho duvidoso
Vos esquece a afeição tão doce nossa?
Nosso amor, nosso vão contentamento
Quereis que com as velas leve o vento?"

Nestas e outras palavras que diziam
De amor e de piedosa humanidade,
Os velhos e os meninos os seguiam,
Em quem menos esforço põe a idade.
Os montes de mais perto respondiam,
Quase movidos de alta piedade;
A branca areia as lágrimas banhavam,
Que em multidão com elas se igualavam.

Nós outros sem a vista alevantarmos
Nem a mãe, nem a esposa, neste estado,
Por nos não magoarmos, ou mudarmos
Do propósito firme começado,
Determinei de assim nos embarcarmos
Sem o despedimento costumado,
Que, posto que é de amor usança boa,
A quem se aparta, ou fica, mais magoa.

Mas um velho d'aspeito venerando,
Que ficava nas praias, entre a gente,
Postos em nós os olhos, meneando
Três vezes a cabeça, descontente,
A voz pesada um pouco alevantando,
Que nós no mar ouvimos claramente,
C'um saber só de experiências feito,
Tais palavras tirou do experto peito:

—"Ó glória de mandar! Ó vã cobiça
Desta vaidade, a quem chamamos Fama!
Ó fraudulento gosto, que se atiça
C'uma aura popular, que honra se chama!
Que castigo tamanho e que justiça
Fazes no peito vão que muito te ama!
Que mortes, que perigos, que tormentas,
Que crueldades neles experimentas!

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